- Medo.
Sem exclamação? Ah, isso sim me
dá medo. É o nome do sujeito que me tira a paz, sujeitinho besta que me tapa os
olhos bem na hora do beijo final. Tapa os olhos, os ouvidos e, eventualmente,
me tira os movimentos. Me imagino milhas distantes de todo esse medo, distante
o suficiente pra nem sequer sentir aquele cheiro insuportável de lágrimas,
aquele gosto salgado que me dá na boca, aquele arrepio frio que o suor me
causa. Sem ele, talvez, pudesse eu ter terminado os mil contos que comecei, as
mil histórias de amor que um dia quis contar aos meus netos, as aulas de balé
clássico e karatê, os rascunhos velhos do moleskine rasgado. Ah, tantos planos
não seriam mais planos, tantos sonhos seriam agora realidade e no meio disso
tudo você, talvez, estivesse ao meu lado, segurando meu polegar contra o teu
rosto. O medo tem mais força que todos
os teus músculos agindo juntamente sob extrema tensão. Você quer correr, quer
dizer sim, beijar mais uma vez, mandar pros quintos, ah, mil coisas, e o medo
lhe segura os pulsos e com toda a sua força lhe minimiza de uma forma tão
grandiosa que a voz sequer sai, o beijo nem estala e o ressentimento acaba
mandando é você pros quintos. É tão fácil dizer que a coragem lhe acompanha,
que você é mais forte que seus medos, é quase nada perto de sentir. Quem teme
sabe como é, por dentro, nas vísceras e lá no fundo daquilo que lhe faz sentir.
Seja lá o que for, o medo sempre vai chegar primeiro. Mas daí, lá vem a parte
boa, ou quase, cabe a você, a mim e ao garotinho com medo de monstros parar pra
pensar no que vai lhe fazer chegar mais longe. Juntar coragem pra ser corajoso,
duas vezes corajoso, duas vezes forte. A diferença entre aqueles que conseguem
terminar e você, e eu, aqui e lá, que nem sequer começamos, é a força, que sabe
lá Deus de onde saí, que os move pra frente. Há dois caminhos, o que o leva
adiante e o que lhe faz retroceder. Se queres ir adiante, assim como eu quero,
é melhor fazer as pazes com o medo, lhe propor um contrato de boa convivência e
ser forte duas, três, quantas vezes der. Um passo de cada vez, mas pra frente.
- Medo!
Com exclamação, aí sim, mais
bonito e eficaz. Medo que vem, se pronuncia e vai atrás de um ponto final em
outro verso. No meu não, não se arrisque a virar pó, meu caro. Tratemos o medo
como uma sensação que vem e segundos depois vai. Vai! Vai. Um ponto final pro
medo de ter medo.
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